A Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”)publicou em 19 de março de 2025, informativo da reunião do Colegiado nº 08, realizada em 18 de março de 2025, na qual foi deliberado, por unanimidade, o acompanhamento, pelo colegiado da CVM (“Colegiado”), do entendimento da Superintendência de Securitização e Agronegócio da CVM – SSE exposto no Ofício Interno nº 1/2025/CVM/SSE/SSE-Assessoria.
Trata-se de entendimento redigido no âmbito de consulta formulada pela Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (“ANBIMA”) sobre a interpretação da CVM dos artigos 43-A e 51 da Resolução CVM nº 60, de 23 de dezembro de2021, conforme em vigor (“Resolução CVM 60”).
A consulta busca esclarecer o correto atendimento às obrigações de apresentação aos investidores e de envio anual à CVM de demonstrações financeiras auditadas de devedores e coobrigados de operações de securitização que respondam por 20% (vinte por cento) ou mais do risco de crédito da operação.
As dúvidas decorriam do uso do conectivo “ou” nos referidos artigos, o que geraria, nos participantes do mercado, insegurança quanto à sua interpretação de forma alternativa ou cumulativa. Ainda, parte das dúvidas advinha de entendimentos anteriores da CVM emanados em Ofício Circular e em decisão do Colegiado, acompanhando manifestação da área técnica, ambos de 2018. Nas ocasiões, a CVM estabeleceu a obrigatoriedade de apresentação das demonstrações financeiras auditadas tanto do devedor como coobrigado com exposição superior a 20% ao prospecto, além deter indeferido pedido de dispensa da entrega de documentos de devedor pessoa física, quando apenas a sociedade de que o devedor era sócio possuía demonstrações financeiras auditadas.
Revogadas as normas vigentes à época, a CVM reviu seu posicionamento, distanciando-se do precedente e permitindo maior flexibilidade aos participantes do mercado de securitização.
Expomos a seguir os principais pontos do novo entendimento da CVM quanto aos artigos 43-A e 51 da Resolução CVM 60:
· Dispensa da apresentação das demonstrações financeiras auditadas do devedor e do coobrigado com exposição superior a 20%: caberá à companhia securitizadora a alternativa de divulgar aos investidores e, anualmente, à CVM as demonstrações financeiras auditadas do devedor ou do coobrigado, caso apenas um deles as tenha. Tal divulgação deverá representar adequadamente os riscos da operação e garantir a devida transparência ao público-alvo da oferta;
· Apresentação de demonstrações financeiras consolidadas: em um desdobramento do entendimento acima exposto, a CVM esclarece que, nos casos em que o devedor é uma sociedade controlada pelo coobrigado ou, ao contrário, o devedor é controlador de seu coobrigado, basta a apresentação das demonstrações financeiras consolidadas da controladora/devedora ou controladora/coobrigada,conforme o caso. Dispensa-se, portanto, a apresentação das demonstrações financeiras auditadas da sociedade controlada;
· Pessoas físicas devedoras ou coobrigadas com exposição superior a 20% em operações de securitização:tendo em vista que pessoas físicas não apresentam demonstrações financeiras eque a exposição de seus dados pessoais iria de encontro às disposições da Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709, de 14 de agosto de 2018,conforme em vigor), a CVM entende que a apresentação das demonstrações financeiras auditadas do coobrigado e/ou devedor, conforme aplicável, é suficiente para o cumprimento dos requisitos regulatórios. Portanto, não há óbice para que pessoas físicas figurem como devedores ou coobrigados comex posição superior a 20% da emissão, desde que a outra parte, seja o devedor ou coobrigado, apresente demonstrações financeiras auditadas;
· Pessoas físicas e/ou jurídicas que passem a representar mais de 20% ao longo do prazo dos certificados de recebíveis: em casos de desenquadramento em razão do pagamento de direitos creditórios que integrem o lastro da operação por outros devedores, ainda que qualquer devedor ou coobrigado venha a representar mais de 20% da emissão, não serão exigidas suas demonstrações financeiras auditadas;
· Inclusão de fatores de risco nos documentos da oferta: nos casos em que o devedor ou o coobrigado possua exposição superior a 20% e não apresente suas demonstrações financeiras auditadas, o prospecto da oferta deverá conter fatores de risco que indiquem apropriadamente o risco decorrente da inexistência de informações financeiras adequadas, bem como incluir fatores de risco específicos relacionados a pessoas físicas, quando aplicável;
· Nos casos em que tanto devedor como coobrigado já possuam demonstrações financeiras auditadas, é obrigatória a apresentação de ambas aos investidores e à CVM;
· Quaisquer informações financeiras dos devedores e/ou coobrigados que tenham sido apresentadas a potenciais investidores, durante a fase de estruturação, bem como durante o prazo dos certificados de recebíveis, deverão ser divulgadas pela companhia securitizadora à CVM; e
· O mesmo entendimento deverá ser estendido aos FIDC, devendo o artigo 45 do Anexo Normativo II à Resolução da CVM nº 175, de 23 de dezembro de 2022, e o item 11.3 do Anexo D à Resolução da CVM nº 160, de 13 de julho de 2022, conforme em vigor, ser interpretados de forma a facultar a apresentação das demonstrações financeiras auditadas dos devedores ou coobrigados de direitos creditórios que componham a carteira de FIDC com exposição superior a 20%.
A mudança de posicionamento da CVM aumenta o número de ofertas que poderão alcançar investidores qualificados, uma vez que, até então, a ausência de demonstrações financeiras auditadas de devedores ou coobrigados com exposição superior a 20% limitava o público-alvo das ofertas de distribuição de títulos de securitização a investidores profissionais, exceto quando devedor ou coobrigado fossem companhia aberta ou instituição financeira ou equiparada.
O informativo da reunião do Colegiado nº 8 de 18/03/2025 pode ser acessado aqui.